Para mim, sempre houve um vínculo afetivo entre os lugares e as músicas. Não consigo dissociá-lo, e, quando viajo, as memórias mais duradouras e intensas são aquelas em que a música esteve presente. A música está ad aeternum na minha mente.
Nunca entendi por que razão em Portugal o consumo de ostras não é mais comum. Talvez por ouvirmos frequentemente dizer que o preço das ostras é exorbitante. Algo que não corresponde de todo à verdade. As percebes ou as ameijoas, por exemplo, são bem mais caras. Creio, porém, que nos últimos tempos, os portugueses estão de algum modo a familiarizar-se com este molusco.
Mas há um país em que a ostra dita leis… A França é o líder europeu na sua produção e consumo – li que são produzidas mais de dez mil toneladas ao ano. Foi na Bacia de Arcachon, mais propriamente na localidade de Port de La Teste-de-Buch, que provei as melhores ostras da minha vida. Imagine-se a minha felicidade… eu que adoro ostras. Este pequeno lugar da Aquitânia é um verdadeiro paraíso para os apreciadores desta iguaria. Inúmeras construções de madeira – nada é deixado ao acaso para preservar a genuinidade – dispõem-se junto às margens arenosas e fartas em recursos nutritivos.
Tudo gira à volta das ostras : os enormes tanques que funcionam como base de fixação para que depois se possam retirá-las, as ardósias afixadas à entrada das ditas cabanas com toda a informação sobre as saborosas iguarias ou ainda degustações típicas com a presença de ostreicultores num ambiente despretensioso e caloroso. Facilmente se percebe que a produção de ostras exige muita dedicação.
Para uma rica produção de ostras, para além de muita abnegação, são também necessárias certas condições climatéricas – a Bacia de Arcachon é muito iluminada pelo sol – e ausência de poluição, já que estes moluscos bivalves são muita sensíveis à deterioração ambiental.
Sentado numa esplanada aproveitando a sombra de uma árvore – muitas das construções de madeira são feitas a partir dos pinheiros da floresta da região – comi umas ostras carnudas e saborosíssimas. Pão, manteiga, limão e vinho branco acompanharam a ingestão das iguarias.
Magnífico.
Quanto à música… desta vez não ouvi música, mas devo dizer que andei todo o tempo com o album “Carrie & Lowell” de Sufjan Stevens na minha cabeça. Literalmente, o compositor norte-americano deambulou pela minha mente o dia inteiro.
Afetuoso, sincero e puro… o album é belíssimo. O músico medita sobre a vida e a morte em tremendas doses de honestidade e de emoção. As letras são intensas – o disco foi feito enquanto Stevens vivia a perda da sua mãe – e ouvem-se de modo resplandecente, pianos e sintetizadores. Que bela memória…. ostras e a música de Sufjan Stevens.
Foto de capa © Miguel Pinho
Décima quinta edição d´ “As sonoridades das viagens“ na Irreversível.
Miguel Pinho é um reconhecido apaixonado por música e autor publicado sobre viagens.
Conhecendo estas premissas, a Irreversível lançou-lhe o desafio de somar as duas, a música e as suas viagens, numa rubrica para Magazine.
Mais recente livro de Miguel Pinho (artigo Irreversível):
“Das Pontes do Porto aos Doces Vinhedos Magiares“.