Lucrecia Dalt editou “¡Ay!” no final do ano passado, o disco foi destaque um pouco por toda a imprensa e blogosfera, da especializada à generalista, da nacional à internacional. Movido por essa curiosidade e pelo hype que recebi das actuações ao vivo, fui até ao gnration curioso, mas também desconfiado quanto baste. O disco não me tinha agarrado.
Lucrecia Dalt tem a habilidade de nos abalroar subtilmente (…)
Em palco, a música experimental de Dalt ganha uma profundidade e textura que não tinha sido capaz de detectar nos discos. Este pensamento, em conjunto com os desempenhos a que assistia, levou-me a divagar pelo 1º concerto de Einstürzende Neubauten a que assisti, no memorável Festival de Arcos de Valdevez 2000. Conhecia e valorizava o trabalho de Blixa Bargeld e Cª, mas estavam muito longe de ser uma banda referência (para mim) até essa data. Desde esse concerto que a minha relação com Einstürzende Neubauten, da auditiva à afectiva e emocional, ficou marcada para sempre. Foi seminal.
O mesmo terá acontecido neste final de tarde em Braga.
Não demorei muito a ficar imerso no distinto universo sonoro que Dalt cria e nos oferece em conjunto com o percussionista Alex Lázaro. Foi uma experiência sonora profunda, intensa, quase íntima. Lucrecia Dalt tem a habilidade de nos abalroar subtilmente, levando o espectador quase pela mão para lugares por vezes ignorados, áreas misteriosas, mostrando o poder que o som pode ter, mais do que a palavra ou as harmonias, na criação de emoções e sensações.
Tipologias como avant-garde, art ou experimental, são facilmente identificáveis nas composições e performance de Lucrecia Dalt, numa fusão com os evidentes traços das suas raízes na Colombia. O intenso Alex Lázaro surge como combinação perfeita para a busca de permanentes equilíbrios entre universos. Contudo, Lucrecia Dalt é autêntica, estando acima de enquadramentos em estilos, ondas ou vagas.
No final do concerto procurei a oportunidade de partilhar umas palavras com Dalt, tinha algo para lhe dizer, e testemunhei a sua natural genuinidade. Depois fomos rapidamente do Blixa Bargeld até à sua abuelita, falamos das suas influências colombianas e sul-americanas, assim como da sua vinda para a Europa e como isso lhe abriu perspectivas para uma nova gama de influências. Terminamos com um abraço e eu fiquei com mais uma cicatriz para a vida.
*Fotos de capa © Hugo Sousa / gnration