Uma espécie de alquimia, fusão de música e palavra, degustação simbiótica. Pairam questões e flutuam reflexões. Tudo excessivamente degustado sem contra-indicações, como um pós-ébrio, daqueles com Bocas Que Sabem a Papéis de Música.

Bocas Que Sabem A Papéis De Música (187)
Do Caos à Hecatombe

Caos é quando o café entorna e estilhaços de vidro e líquido acastanhado e quente se espalham indiscriminadamente, atingindo tudo o que apanham pela frente. Hecatombe é outra escala: o café entorna, os fragmentos soltam-se, a cozinha entra em combustão e o prédio explode em virtude da queda inesperada de um meteoro. No nosso tempo, qualquer contratempo é um gigantesco incómodo… basta o Wi-Fi tossir três segundos e está montado o circo de uma hecatombe nacional. Na Grécia Antiga, hecatombe significava o sacrifício de cem bois. Hoje grita-se “apocalipse” por dá cá aquela palha. Se Homero assistisse, ordenava uma reedição da Odisseia alterando o título para “Odisseia no Hipermercado, Secção Artigos para o Lar”. As hecatombes reais perdem para o drama caseiro. É o que se pode chamar de concorrência desleal. O verdadeiro apocalipse é o deputado aos berros, como se ditasse os Dez Mandamentos de megafone em punho. É o telemóvel que morre às três da manhã. Vivemos num parque temático da tragédia instantânea: quanto mais ridículo o drama, mais épica a legenda. Do caos à hecatombe vai um estalar de dedos… E se algo correr mal na emissão de hoje, podemos sempre registar o programa como a maior hecatombe radiofónica desde a invenção da torradeira.


Autoria, Locução & Realização
Lady Jane Doe & Retroneofora

Jingle:
Jorge da Rocha (Música) & Peter de Cuyper (Locução)

Produção
O Mau Produtor