Para mim, sempre houve um vínculo afetivo entre os lugares e as músicas. Não consigo dissociá-lo, e, quando viajo, as memórias mais duradouras e intensas são aquelas em que a música esteve presente. A música está ad aeternum na minha mente.
Pouco mais de três décadas após o Cerco de Dubrovnik, que resultou na destruição de centenas de edifícios do centro histórico, tudo foi minuciosamente reconstruído e, hoje em dia, a cidade croata apresenta-se belíssima a quem a visita. Charmosa, impactante, percorreu um caminho com quase mil e quinhentos anos até repousar de modo abençoado num promontório rochoso junto ao mar Adriático.
As praças – repletas de turistas de rostos alegres – dão música a quem passa…as melodias de Alice Coltrane e de Pharoah Sanders escoltam-me por caminhos empedrados até recantos encantadores. Quando menos espero, avisto por detrás de uma qualquer esquina um palácio fabuloso ou uma vista secreta para o imenso mar azul-turquesa que banha as muralhas de Dubrovnik.
As múltiplas escadarias funcionam como janelas abertas para o Adriático. São tantos, tantos… os miradouros diante dos meus olhos.

Depois de umas quantas horas a passear por torres e bastiões, observando os mosteiros, as igrejas e os fontanários, mas também os requintados cafés e restaurantes, decido dar descanso ao corpo e apreciar a vista para o Adriático através do terraço dos meus aposentos que se localiza bem acima das muralhas da cidade.
Não muito distante do apartamento fica um interessante minimercado, que visito. Está cheio de especialidades culinárias da Dalmácia. O resultado da minha visita parece-me promissor…vinho branco da região, queijo de ovelha da ilha de Pag, pão fresquinho, melancia, figos torrados e biscoitos de pistácio. Pressinto que o meu corpo necessitará de muita energia para o banho de emoção paisagístico que me aguarda.
Já no pátio – carregado de videiras e com vista impressionante para o mar e parte antiga da cidade – as iguarias regionais são colocadas numa toalha de pano estendida sobre uma mesa de pedra.
E a vista… Os icónicos telhados de terracota deslizam sobre os navios do Adriático. que parecem navegar ao ritmo do toque dos sinos das igrejas. Penso para mim mesmo que Dubrovnik é uma das cidades mais fascinantes da Europa. Sinto alguma dificuldade em escolher a música certa para acalmar o meu entusiasmo… mas eis que surge numa brisa por entre o emaranhado de plantas e flores a música de Phil France. Será ajuda divina? Não ouso falar durante toda a audição do álbum “Circle“, limitando-me a desfrutar da eletrónica emotiva do compositor britânico. Experiência inesquecível!
Vigésima quarta edição d´ “As sonoridades das viagens“ na Irreversível.
Miguel Pinho é um reconhecido apaixonado por música e autor publicado sobre viagens.
Conhecendo estas premissas, a Irreversível lançou-lhe o desafio de somar as duas, a música e as suas viagens, numa rubrica para Magazine.